Perplexidade
A arte de se surpreender todo dia
De tratar como novo o que você já conhecia
Sentir uma emoção como adolescente
Desconhecer o que lhe é evidente
Dançar música lenta com o tal nervosismo
Se achar a rainha do amadorismo
De falar o que sente sem pensar
E a torneira dos olhos não fechar
De abraçar com calor no peito
E receber elogios sem jeito
Se entregar aos fascínios da natureza
E esquecer sua própria beleza
Ter olhos de criança
E uma memória desajeitada
Voz falhada para falar
Voz falada, porém, não fadada
Não saber como uma música tocada, pela milésima vez, vai bater nos tímpanos do coração
Perplexidade
Não tem a ver com idade
Talvez com certa flexibilidade
Deve ser um traço de personalidade
Ou a benção de alguma divindade
Ser perplexível
Não somente se deixar levar (se deixar perplexar)
A sorte de ser perplexo de dentro para fora
E não de fora para dentro
De ter perplexidade desde o nascimento
Vulneravelmente julgada:
Infantil, inocente,
Carente, amalucada
Não é falta de memória
Na verdade; é a única forma de ser
Não existir
Somente ser o que se é
Sé de si
O que se vê
O que se sente
Se respira, expira
Com ou sem som
Mas sempre exclamação
Exclama som!
Pode ser horror
Mas também gratidão
Pode ser coragem
Encorajamento em vão
Nos olhos, nos gestos, no jubilo e no inferno
Ela tem a fé que eu não tenho
Nenhum milagre me deixa perplexo
Mas continuo a pegar sua fé emprestada
Junto com seu poder de (não) lembrar
Ter a leveza do retorno
E estar perplexa de novo