Diário aberto 16 de maio

Algum velhinho simpático disse que o sonho é o guardião do sono (Freud). Esta tarefa se torna mais difícil quando se está lutando contra a luz do dia. Acordo todo dia as 7am pois meu quarto não tem cortinas e tento dormir novamente ate umas 8:30am. Nesses últimos minutos eu sonho novamente, uma batalha acirrada, onde a vontade de mijar deixa a briga desproporcional. Meu corpo não quer se mexer enquanto minha cabeça tenta lembrar o sonho. Hoje sei que foi algo bom, estava divertido, haviam pessoas queridas, tenho saudades.

Uma coisa que eu sinto falta é sentir o cheiro das pessoas. Há quanto tempo eu não passo um perfume? Ha quanto tempo eu não cheiro um cangote? Ou uma virilha?!

Será que se essa quarentena se estendesse ao infinito (quarETERNA) nosso olfato perderia relevância dentre nossos sentidos, tão importantes para a construção de realidade. Meu celular não fede nem cheira, os gatos aqui de casa também não. Que vida será essa sem perfumes e fedores? Assim que coloco os pés no chão sinto o cheiro do café que vou fazer, percorro o corredor ecoante e me deparo com um abraço quentinho de cheiro de pão de queijo. Beibe mudou meu dia e respondeu minha pergunta epigenetica sobre as consequências da quarETERNA. Meus olhos não acreditaram no perfume que me acometia, seria um sonho? Um sonho de sair para rua, de olhar para cima e ver o céu de são Paulo desenhado por prédios, fios, árvores e rastros de aviões. De sentir a circulação conturbada de uma cidade que não nasceu para ser estática, de andar pela calcada pensando na vida, de entrar numa padaria e pedir um pao de queijo e um café com leite. De escrever esse diário sentando num lugar onde as pessoas são somente imagens mas se eu esbarrar em uma delas eu terei uma reação, assim como o cheirinho de pão saindo do forno esbarra em minha atenção contemplativa na calcada.

Hoje nao é um bom dia pra mim e nem pra voce. Todos os dias nossos sonhos são interrompidos (por algum tipo de consciência, algum tipo de luz) .

[A próxima frase motivacional que caberia perfeitamente aqui seria: “acorde e vá atras dos seus sonhos. Transforme seus sonhos em realidade. Voce pode!” Acho que pouca gente sabe bem qual é seu sonho (como objetivo), não quero generalizar, mas grande parte do mundo vive em inércia acomodativa, na riqueza ou na pobreza. E tudo bem].

Quando eu peguei aquele pão de queijo a primeira coisa que fiz foi cheirá-lo. Um outro cara disse uma vez que metade do gosto das coisas está no cheiro (Joey Tribianni). Esse ato me fez viajar para muitos lugares, para a Rio-Lisboa, para a minha infância, para as tardes em Pinheiros. Nao deixemos que a quarentena acabe com nosso poder sinestésico de viajar no tempo. Por mais que o olfato como forma de encontro interpessoal esteja em desuso, ainda podemos usufrui-lo muito bem na cozinha. Quando eu sentir saudades de você, eu vou pra cozinha, e de olhos fechados eu vou te encontrar.

Publicado por cristiano benitez

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